Dr. Manhattan



Eu: Quero escrever um conto, mas to sem ideia, só to com a inspiração... Então, você quer cria um personagem, ambiente, aspectos da personalidade do personagem, sei lá, um roteiro...

Rília: O personagem principal vai ser um menino de 17 anos, relativamente pobre. Ele vive, ou vivia em um lugar onde todas as pessoas eram diferentes dele. Ele é romântico, gosta de coisas que nenhum outro menino da comunidade pobre dele gostavam. Mas vai ter que acontecer alguma coisa. Que ele vai encontrar uma menina, que é completamente diferente dele. Gostava de sair pra balada, e essas coisas. E aí você desenrola uma história de amor entre esses dois, e ela vai ficar muito doente. O que vai acontecer com os dois?
Como eles vão se sair nessa? Você escreve.

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1987 
Chicago - Stateway Gardens 

Bolas quebravam janelas quase todas as tardes, e nas outras os garotos gastavam o dinheiro, que só pela existência já os faltavam, em jogos de fliperama. Assaltos são comuns, mas na verdade ninguém se importa. A maioria ali já roubou algo, um pedaço de pão em uma padaria, uma maçã em um supermercado, uma vida numa esquina...
Com 17 anos, Luiz anda pelas ruas esburacadas e avermelhadas em algumas partes, lendo seu HQ do Watchmen. Seu personagem preferido é o Dr. Manhattan. 

"A maneira que ela vê o passado, o presente e o futuro em uma única linha, sendo capaz de saber exatamente o que pode acontecer... Além de conseguir se teletransportar para qualquer parte do Universo e viver sob qualquer atmosfera, é lindo" - pensa, enquanto ao seu lado um garoto não retira os olhos do HQ, desejando possuí-lo mas sem a coragem suficiente para rouba-lo. Porém o que ele mais gosta no HQ não é propriamente o herói, mas a namorada do herói. É desses garotos que ainda fantasia e acredita existir um amor de verdade por aí... Talvez não machucou o coração o suficiente, ou sempre será um bobo a acreditar em coisas bobas. A frente de sua casa é a única com cor em todo o bairro. Vermelho, branco... Luiz cuida de rosas que ele mesmo plantou. O único ponto onde o vermelho não surgiu da violência e o branco não é misturado com o cinza do cimento... Ganhou as sementes ao limpar a casa da senhora Lizbeth. É o único no bairro que nunca roubara nada, nem corações...

Ele poderia viver assim para sempre, sem conhecer as nuances de uma cicatriz sentimental doce a azeda e o gosto de lágrimas suplicantes. Leria feliz seus HQs e ajudaria velhinhas a atravessar a rua. As rosas floririam mais e mais... Trocando seus brotos e furando dedos com seus espinhos. Porque rosas são geniais. Trazem em si mesmas a beleza e a dor implícitas em toda a sua forma em vida. Contudo... A vida muda, pessoas mudam de cidades... E mesmo Stateway Gardens sendo um bairro extremamente pobre, pessoas também vão morar ali. E a neta de Lizbeth assim foi. Tati seu nome, festeira, pouco sentimental, um tanto ranzinza para a sua idade mas é só um reflexo da sua preguiça mental. 

Pobre Luiz... Ao ir limpar a casa da senhora Lizbeth não imagina quem e o que iria encontrar. Estavam sozinhos, ao vê-la Luiz paralisou-se, sua boca entre abriu, o coração disparou e teve que levar a mão ao peito porque parecia que o coração iria pular para fora. Encontrou em Tati um sentimento novo, coisas novas a nos mudarem por dentro... Tati não se importou com ele. Um garoto fora do comum, apenas seu ar já ressoava estranhamento pela casa, imagina sua personalidade! Ela gosta é dos garotos com carros, dos que têm dinheiro roubado, tem sede de perigo e não sabe medir limites.

-Meu personagem preferido é o Dr. Manhattan - disse Luiz à garota, suas primeiras palavras.

Ele sempre planejou isso, para ele todos conheciam seu personagem preferido! E sendo o seu herói romântico, sábio e incrível a garota com certeza se apaixonaria por ele também. Afinal somos o reflexo de nossas escolhas. Infelizmente uma garota com aquela mentalidade não sabia disso. Luiz está prestes a se chocar com a realidade.

-Nunca fui nessa cidade, o dinheiro está na cômoda quando sair.
Limpar o chão nunca fora tão doloroso. O esfregar do pano parecia levar séculos para chegar dum ponto ao outro. Mas um produto especial limpava tudo agora: Lágrimas. Ouviu enquanto limpava os vidros Tati marcar com um garoto para ir numa festa a noite. E pelas conversas a noite não trará apenas uma festa social... Mas também particular.
-Posso cuidar melhor de você do que ele - sussurra Luiz.
De repente, quase que subitamente toda a casa começa a tremer forte, os quadros caem quebrando e o barulho de jarras caindo trinca o outrora silêncio em fortes barulhos. O teto da sala despenca tampando a saída, quase todos os cômodos caem, menos o da sala, onde Luiz e Tati estão. Estão presos e temendo a própria vida. Neste momento Luiz tem uma ponta enorme de inspiração. Corre e abraça Tati que se encontra em lágrimas e com os olhos esbugalhados.

-Tudo ficará bem, meu amor - ele diz.

O "tudo ficará bem" soa como algo clichê na mente dela, e não acalma, mas o "meu amor" desbugalha seus olhos e provoca uma sensação estranha em sua mente. Nunca ouvira essas palavras. Sem querer ela empurra Luiz e olha com desdém para ele, mas segundos depois o volta a abraçar. O medo de morrer é maior do que o medo de si mesma. Aos poucos ela se acalma completamente. E pelas horas que se passam... Eles conversam bastante, Luiz explica o significado romântico e filosófico do seu herói, no começo ela não quer nem ouvir, mas aos poucos acha muito interessante, afinal ela não tem para onde fugir. Luiz conta também sobre as rosas que ele cuida e como acha bonito o contraste dela com as cores da rua. Tati aos poucos se apaixona por ele... Ela não imagina que alguém com essa idade poderia ser tão encantador. Eles esquecem até que estão presos por horas, muitas horas, sorriam juntos, e se beijam depois de longos minutos olhando um para o outro. Tati é outra pessoa, horas com alguém inteligente sendo capaz de absorver o que ele diz dilacerou sua ignorância. Se beijam longamente, os segundos passam lentamente, e não percebem um barulho estranho acima de suas cabeças, um ruído de algo a se quebrar.

É o teto! Que buscando assassinar aquele momento... Cai em cima dos dois, ela por cima dele, olhando em seus olhos, com sangue em sua boca. Sussurra pingando sangue no rosto dele:
-Foram as melhoras horas da minha vida...
-As minhas também, meu amor.
Ela parece sorrir e sua alma escapa lentamente...

As falas foram traduzidas fielmente. Horas depois os corpos foram encontrados, morreram abraçados e com o sangue em junção.

... Lucas Augusto ...

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