Estação Prefeito Celso Daniel, Santo André

Eu a vi. Ela me viu. O mundo parou. Senti-me sendo puxado na direção dela. E estranhamente percebi que ela sentiu o mesmo. Nem eu e nem ela conseguíamos parar de olhar para outro. Era diferente, eu não percebia os traços físicos, pela primeira vez, não era para o tamanho ou não tamanho dos dotes que eu olhava. Era para ela. Para o fundo infinito das pupilas castanho-escuro. O redor perdeu a cor e seu contraste aumentou a cada milésimo de segundo focado nos olhos imóveis dela.

O trem apitou anunciando a partida e começou a se mover. Assim como eu, por dentro do trem, comecei a andar lutando contra o movimento natural da imensa máquina. Ela estava na plataforma oposta e começou a andar também. Nossos olhos não desgrudavam. Nossas bocas não conseguiam proferir um som. Um único som. Nossos corpos, involuntariamente, lutavam para não perder a possibilidade de contato, de fusão. Pareceu uma eternidade e ao mesmo tempo uma respiração.

Ela parou no fim da plataforma e eu parei no último vagão. A cada metro por segundo criado pelo movimento audível do vagão era como o rompimento de cordas internas que eu nunca percebi que possuía. Ela sentiu o mesmo, porque eu sentia o que ela sentia, e ela sentia o que eu estava sentindo. Loucura. Eu simplesmente sabia.

Nos dias vindouros não mais a vi. Nunca mais. Não importa quantos cálculos eu fizesse sobre a hora que eu a vi. A hora que entrei no trem. O clima daquele dia. A quantidade pessoas. A hora que acordei e me levou àquele instante. Não. A matemática, aplicável ao universo, não se aplicava a ela.

Meses. Eu nunca esqueci. A fotografia perfeita dela e do milésimo de segundo que quebrou o espaço-tempo de todas as possibilidades, do amor. Não. Não era amor. Era algo além. Sem nome. Não conhecido. Era uma fusão sem toque. Um eu se fragmentando no nós. Uma reconciliação de universos separados no berço celestial das reencarnações.

Mas eu sei que ela está por aí.

E ela sabe que eu estou por aqui.

E, estranhamente, isso basta.

L.A.

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